O contato inicial foi virtual, mas, mesmo a quilômetros de distância, não menos marcante. Ao ouvir sua palestra via Skype na 5ª Annual Strategy Conference da HSMAI Brasil, no mês passado, escutei coisas bastante intrigantes. Como a tecnologia de comando de voz influenciará o mercado hoteleiro? Conseguirá o Instagram ir além da sua função como plataforma de conteúdo? Qual papel o Airbnb, que fez 10 anos de fundação em 2018, ocupará no mercado? Bem, Luke Bujarski respondeu a esses e outros questionamentos durante o evento, mas minha curiosidade permanecia intacta após sua fala de 40 minutos.

Ato contínuo, ainda no evento, peguei o contato de Bujarski com a organização e prontamente enviei um e-mail solicitando uma entrevista. Menos de uma hora depois já tinha o bate-papo agendado. “Happy to do an interview. Monday or Tuesday are looking good. How about 10am NY time? (“Fico feliz em dar essa entrevista. Segunda ou terça-feira é bom para mim. Que tal 10h no horário de Nova York?”, na tradução livre). E assim foi. Poucos dias depois conversamos por 45 minutos – novamente por Skype.

Para saber melhor quem é Luke Bujarski, sugiro uma analisada em seu perfil no LinkedIn. Basicamente, o morador de Nova York tem uma carreira direcionada para a área de pesquisas, em especial na indústria de viagens. Com passagens pela Phocusright e Skift Research, o executivo atualmente toca a Luft, empresa independente de análise focada em estudos de mercado sobre o setor turístico. Hoje, não é exagero apontá-lo como um dos grandes estudiosos a respeito de tendências da indústria de viagens em todo o mundo.

Luke Bujarski - foto interiorBujarski é um grande estudioso sobre o setor de viagens

Luke Bujarski: tendências para o setor

No evento da HSMAI, por exemplo, Bujarski mencionou um dos projetos mais recentes do Luft. Trata-se do Quest, espécie de repositório com 360 perguntas poderosas sobre diferentes atividades ligadas ao turismo. Em sua palestra, ele abordou 10 delas, que você pode conferir aqui. Em nosso bate-papo, tentei ampliar um pouco o que foi discutido na conferência, colocando ainda novos tópicos em discussão. Veja abaixo alguns dos insighst de nossa conversa:

Duopólio Google e Facebook

Hoje, parte expressiva da mídia digital paga se concentra nas mãos desses dois players, e isso vale para qualquer setor da economia. No turismo, o Booking.com, por exemplo, é um dos maiores anunciantes do Google Ads, investindo bilhões anualmente em links patrocinados. Será que essas duas empresas podem ganhar concorrência? “Ainda é difícil apontar outra alternativa para fugir do duopólio. Google e Facebook continuarão liderando, mas acho que outros canais podem ganhar espaço em breve. Pode ser a Amazon, quem sabe”, questiona Bujarski.

Book on Google

A primeira grande rede internacional a aderir foi a Choice Hotels. Afinal, até onde pode ir a nova ferramenta do Google? É no mínimo estranho ver a gigante de tecnologia dar esse passo, uma vez que as OTAs são GRANDES clientes de mídia paga (como citamos no tópico anterior). “Acho que a empresa foi, por muito tempo, boazinha. É preciso ter atenção com essa ferramenta. Daqui a pouco, pode-se chegar em um ponto no qual a plataforma será boa suficiente para pressionar as OTAs”, aponta Bujarski. “Por muito tempo, o Google ficou focada em links patrocinados e no modelo CPC (Custo por Clique) para gerar tráfego para os hotéis. Estes, por sua vez, ainda acham mais barato fazer esse tipo de investimento, mas até quando? O Google começa a educar a hotelaria, principalmente independente, para, em vez de focar em links patrocinados, usar também a ferramenta de reservas. Vamos ver onde isso vai parar”, completa.

Instagram

A rede social está na crista da onda, isso é inegável. Talvez, para a geração Millennial, seja a plataforma mais atrativa de conteúdo no mercado. Conseguirá o Instagram migrar de um excelente canal de awareness e branding para se tornar um gerador de vendas dentro da própria plataforma? “Para isso acontecer, o Instagram precisa melhorar seu mecanismo de busca, que é focado nos perfis, hashtags e locais. A busca por palavras-chaves é ineficiente. Coloque o termo ‘pizza NY’ e veja o que acontece”, indaga Bujarski. “Quando houver melhora nessa funcionalidade, e eles certamente estão trabalhando nisso, podem se tornar uma plataforma de e-commerce eficiente para hotéis e restaurantes”, acredita.

Luke Bujarski - tendências para o turismoAirbnb como OTA? Onde isso pode parar?

Airbnb

O Airbnb completou 10 anos em 2018. Neste ano, firmou parceria com o SiteMinder para o desenvolvimento de uma plataforma conjunta. Nela, hotéis-boutique, pousadas e bed & breakfast terão à disposição um sistema de gestão de canais. Em resumo, o Airbnb virou uma OTA. E agora? “Acredito que, em 2019, teremos mais certeza de como a companhia competirá com o setor de hospedagem tradicional. É preciso levar em conta também que a empresa está para se tornar um canal viável de distribuição para muitos hotéis. Para a hotelaria, agora se tornou uma questão de estratégia e competição”, destaca Bujarski. Para apimentar o debate, com seu tão aguardado IPO (Initial Public Offering) previsto para 2019, dinheiro não faltará para o Airbnb…

OTAs e segmentação

Hoje, como na mídia digital paga, podemos apontar também para um duopólio. Expedia de um lado, Priceline Group do outro. Ainda assim, para onde caminhará o segmento de OTAs? Como mencionado nos tópicos anteriores, será que um dia o Airbnb e Google podem entrar nessa dança? Além disso, poderemos ver, como no mercado tradicional, maior segmentação entre agências de viagens virtuais? Bujarski acredita que essa é uma possibilidade. “Aparentemente, as OTAs estão muito preocupadas com a oferta, parecendo ser esta a estratégia central. No segmento de aluguel de temporada, Airbnb segue caminho parecido. Agora, será que os consumidores terão interesse em vasculhar uma plataforma com centenas de milhares de hotéis para fazer sua escolha”, questiona. “Se olharmos para o segmento de aluguel de temporada, há sites especializados em imóveis de luxo ou para mochileiros, por exemplo. O fato é que, desde sempre, as OTAs se posicionam como uma plataforma full service. Agora, será que isso atende realmente aos desejos do consumidor? Acredito que essa premissa não necessariamente é verdade, o que pode abrir espaço para segmentação”, acrescenta.

Comando de voz

A Marriott International já oferece serviço de concierge virtual pelo Alexa. Expedia e Google fecharam parceria para possibilitar reservas pelo Google Assistant. Para Bujarski, sistemas de comando de voz entrarão cada vez mais no planejamento das grandes redes hoteleiras. Será que a tecnologia poderá ser uma opção para investimento em termos de mídia? “Hoje, vejo Google e Amazon à frente nesse serviço. Acho que, em breve, essas empresas acharão uma maneira de monetizar em cima da plataforma. Ainda assim, quando isso ocorrer, acredito que a tecnologia estará muito diferente do que vemos hoje. Será uma transformação similar à migração do tráfego dos desktops para mobile”, acredita. “Ainda assim, onde estará a real utilidade do comando de voz durante a jornada de compra do consumidor. Nas buscas? Nas compras e reservas? Nos serviços de atendimento ao cliente? O ponto fundamental é realmente tentar prever a fatia que a funcionalidade terá nesse tipo de serviços. Não sei se alguém tem a resposta agora, mas com certeza é uma ferramenta muito poderosa”, completa.

Luke Bujarski - comando de vozMarriott já tem acordo com a Amazon; outros players entrarão nessa

Blockchain   

Por um tempo, principalmente quando a cotação do Bitcoin estava nas alturas, blockchain era uma das palavras da moda. Arrefecida a euforia, qual o futuro dessa tecnologia dentro da indústria do turismo? “Se você pensar nos pontos de programas de fidelidade como moedas, e inegavelmente há muita ineficiência na forma como esses pontos são transacionados, acho que o blockchain pode facilitar e melhorar bastante esse processo. O setor de viagens ainda não chegou lá, assim como as empresas que desenvolvem essa tecnologia, mas quem investiu nisso nos últimos anos quer refazer seus investimentos – que foram grandes. Certamente vão achar alguma aplicação para a tecnologia. Na minha opinião, os programas de fidelidade são um campo fértil. Pode ser um casamento bom”, acredita.

(*) Crédito da capa: geralt/Pixabay

(**) Crédito das fotos do entrevistado: arquivo pessoal

(***) Crédito da imagem: Divulgação/Amazon