Márcio Moraes

Saia da Zona de Conforto. Quantas vezes você já ouviu essa frase? Palestras motivacionais, livros e vídeos de auto ajuda celebram essa afirmativa como uma metodologia para atingir o ápice do profissional talentoso. Colocam você contra a parede, o pressionam para sair do comportamento dito comum, mesmo a contra gosto. Para muitos serve como mantra para atingir o grau de aceitabilidade no mercado de trabalho e mostrar à todos o quanto você é capaz de entrar na “selva, lutar com os leões e sair com feridas”, que farão de você um profissional melhor. Muitos seguem esse script por longos anos na tentativa de se alinhar a padronização de comportamento exigido. 

Preciso sair da zona de conforto!

Isso martela na cabeça dos profissionais, que saem às cegas em busca de novas experiências e encontram biografias, histórias, lendas e gurus da administração à disposição para oferecer o caminho deles como referência. Esse detalhe é muito importante
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— o caminho deles. Num momento de reflexão, muitos profissionais olham para o passado e percebem os caminhos trilhados, ditos ideais, envolvendo mais sacrifícios do que esforços, sem conseguir o mesmo efeito prometido. Óbvio, aquele caminho foi feito por outra pessoa, com comportamento diferente. Seria muito fácil se todos se chamassem Carlos “Wizard” Martins, Alexandre  “Cacau Show” Costa, Robinson “China in box” Shiba, Bernardo “Ambev”  Pinto Paiva, Paula “Microsoft” Bellizia, Cledorvino “Fiat” Beline, Cristina “SAP” Palmaka, Carlos “AB Inbev” Brito, Roland “Accor” de Bonadona, Arie “hoteleiro, sobrevivente do Holocausto” Yaari, Maria “mãe” Pereira Moraes. 

Sim, Maria Pereira Moraes, é minha mãe, um grande referencial de vida pra mim, porém não sou como ela, temos personalidades diferentes. É uma referência de aprendizado, não consigo copiá-la, por mais que eu a admire. Os caminhos percorridos por ela foram bem traçados, preciso seguir os meus, às vezes contrariando as decisões tomadas por ela sobre o seu próprio caminhar. Tínhamos um elo muito forte, foi minha conselheira, bastava um olhar de tanta sintonia. Não tenho o comportamento dela, mesmo sendo seu filho, não consigo traçar o mesmo caminho, são realidades diferentes, momentos diferentes. Se com ela tenho essa dificuldade, imagina uma pessoa ao qual tive acesso por reportagens, biografias, currículos ou mesmo convívio em ambiente de trabalho. Quando falo de comportamento, estou me referindo as respostas dadas à cada decisão, nos momentos de crises e soluções. Não há como viver a vida do outro, podemos apreender com todos eles, porém utilizaremos esse aprendizado de outra forma, a nossa maneira. 

As decisões não são terceirizadas, como se fosse na metodologia científica, citar autores de frases, pesquisas e pensamentos, estaríamos blindados da culpa pelos erros já que o mesmo método foi seguido à risca. Se assim fosse também dedicaríamos o sucesso a terceiros. Aprovados ou reprovados numa banca, seguiríamos para uma próxima tentativa, adotando citações de outros autores.  

Se pudéssemos perguntar a cada um dos mencionados acima se eles tinham certeza das conquistas realizadas, antes de tomarem as primeiras decisões como adulto, “donos das próprias pernas”, muitos diriam que chegaram além ou aquém dos objetivos traçados. Conhecemos deles somente as boas notícias e as superações, todo o trajeto não é revelado. 

Vi pessoas amáveis, projetarem uma imagem agressiva, por acreditar que amabilidade é uma fraqueza e não uma virtude na liderança. Os de comportamento mais original, receoso que seu jeito independente prejudicasse a carreira, vivendo por longos anos de forma comedida e contida. O indivíduo paciente, ponderado, bom ouvinte, acreditando que tais talentos não são bem vistos pelo mercado, preferindo se projetar como uma pessoa impetuosa e impaciente acreditando que assim estaria em conexão com o Senso de Urgência, bastante valorizado por muitas empresas.

Assim, também os previsíveis, facilitadores da autogestão, porque os liderados sabem que as respostas para as mesmas demandas serão iguais, preferindo projetar o comportamento imprevisível, apostando se aproximarem do perfil criativo. Há também aqueles demorados em tomar decisões, pesquisam, analisam com profundidade para evitar riscos, ao invés disso fazem as mudanças rapidamente com pouco planejamento, no esforço de estarem mais próximos dos ditos ágeis e altamente flexíveis. 

Entender seus limites para poder quebrá-los ou simplesmente conviver com eles é básico. Qual o problema da governanta sem  interesse em seguir para o cargo de gerente de hospedagem? O propósito dela é ser uma ótima governanta. Ao mesmo tempo, encontro camareiras traçando seu futuro em busca do cargo de gerente geral. Ambos estão certos, cada um sabe o esforço de vida que executará para atender esses objetivos. 

Tive o prazer de encontrar profissionais nesses dois cenários e ambos me perguntaram se estavam errados em pensar dessa forma. Um pelo estereótipo de desmotivado e outro preocupado com a ambição. Ao mesmo tempo, encontrei pessoas desconectadas do seu talento natural, tentando se adaptar a um universo apresentado como ideal, porém não compatível à ele. 

A vida é complexa para brincarmos de faz de conta. Claro, não há como utilizarmos somente nossos talentos naturais, há demandas que exigem comportamentos diferentes, porém apenas por uma hora, duas, um dia e não por toda vida. Assim, muitos vivem na zona do desconforto, nunca experimentaram a alta produção utilizando os talentos naturais. Porque o mercado insiste em dizer, duramente, “saia da zona de conforto”, se não conhece a sua própria, como experimentar outras? 

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Márcio Moraes é gerente de Carreira na QI Profissional, especializada no mercado de hospitalidade. Professor Universitário. Formado em Hotelaria,  especialista em Qualidade e Produtividade, Planejamento e Marketing, formação avançada em DISC (ferramenta de análise de competências comportamentais).

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