Julio Gavinho

O escritor Ian Fleming é mundialmente conhecido por ter dado vida ao agente secreto James Bond, aquele que ao contrário de alguns policiais brasileiros, tinha permissão para matar. O primeiro livro (sim, o primeiro!) de Fleming foi Casino Royale, lançado em 1953 no glamour da locação fictícia em um cassino da costa francesa. Mr. Fleming todavia migra para a simplicidade mundana do nome do super agente secreto: o James Bond de verdade era um observador de pássaros das Antilhas, autor do pouco conhecido “Pássaros das Índias Ocidentais”. Melhor que isso só o Jason Bourne, mas esse personagem não sabe a que veio, não tem charme, não frequenta cassinos. Os destinos turísticos de ponta no cinema sempre tem um cassino. Interessante.

Estamos nos estertores de uma era de trevas legislativas aonde coisas como reforma da previdência, reforma tributária, aprovação e regulamentação do jogo de quota fixa e a reforma do judiciário finalmente serão iluminadas pelo bom senso. Um país que almeja deixar o terceiro mundismo deve obrigatoriamente buscar todas as fontes lícitas de receita e a partir deste abraço cívico, investir no que é de sua obrigação. Ao invés de criar e recriar impostos novos sobre receitas velhas (o seu salário, por exemplo), o nosso governo deveria buscar tributar o din-din que ainda não faz parte do caixa – quem sabe, nos jogos de fortuna ou de quota-fixa. Dinheiro fresco, imposto fresco.

Depois de militar por mais de 30 anos no setor de viagens e turismo aqui em terras de Capitu, devo confessar que estou meio cansado desta cantilena de “bonito por natureza”. Já viajei por cinco passaportes lotados e vi lugares que são expoentes dos nossos sonhos de viagens e que vá, desculpe aí, não são lá essa Coca-Cola toda. Recebem turistas a beça, os seus hotéis são caríssimos, as refeições são uma pequena fortuna, os cassinos são bem mais-ou-menos mas estão ali, fazendo uns bons cobres com o setor. Impactam direitinho no seu PIB e a população recebe o visitante de braços abertos.

Não farei listas e espero que você também não os faça – mas eu sei e você sabe que aquele “lugar” ganha mais dinheiro do que nós como destino turístico. Os fatores preponderantes para este pinga-pinga de cascalho são os que você quiser elencar, e da forma que você preferir ver MAS a proximidade dos centros emissores ainda é, de longe, o maior indutor de viagens do universo. O restaurante do Sr. José vende mais porque está em frente aquele grande prédio de escritórios. A universidade que tem o maior número de matrículas coincidentemente é aquela que está mais próxima do terminal de ônibus ou da estação de metrô. Nós fomos a lua primeiro porque, mesmo sabendo que não haveria “lunáticos” passeando no cavalo de São Jorge, era o lugar mais perto para iniciar nossa epopeia Kubrickiana…

Usamos esta máxima para hotéis (location-location-location) mas ignoramos esta variável para nossas próprias macro análises. Estamos tão impregnados de autoestima que consideramos a praia de Itacoatiara muito mais bonita que qualquer uma da Croácia e, pelamordedeus, não entendemos por que os turistas do novo e velho mundo vão até lá e não vem até aqui. “Somos uns injustiçados!”, diz o meu eu irônico.

Veja você que entre os 15 principais geradores de $$ do setor de viagens e turismo vis-a-vis seu próprio PIB estão a Turquia em 8º com 4,3% do PIB; Islândia em 4º com 8,4% do PIB, México com 8,6%, Portugal com 9,2% e a Gloriosa Fúria Espanhola com 11,1% do seu PIB proveniente de viagens e turismo. Estes dados são da WTTC, de 2019 (referentes a 2018). Uma análise mais detida demonstra que quanto mais pujante a economia (incluindo indústria e serviços), menor a representatividade do setor no cenário econômico. Ah, é? Sim, ah é. Entre 15, os USA estão em desconfortável 12º lugar com 2,7% do seu PIB pingando do nosso setor. 2,7??!?

Sim. E são os maiores 2,7% que você verá, se sua HP estiver com bateria. Puxe aí o PIB de cada um dos 15 e olhe bem nos olhos dos valores absolutos. A resposta está aí, não nas belezas de um país tropical e bonito por natureza. Não está no flamengo nem na minha afro-brasileira chamada Tereza. 

Precisamos rever nossa noção de produto, sua colocação nas prateleiras internacionais e, como estamos assim-assim de resultados, precisamos escolher bem os nossos compradores e sair, cirurgicamente, vendendo. 

São muitos os elementos que compõem um produto turístico. A mesma ilha do Caribe não serve para todos (St. Barth?); o mesmo destino ecoturístico não serve para todos (Tanzânia?); a mesma metrópole (NY?) ou o mesmo destino de entretenimento e lazer adulto ou familiar (Vegas?) não serve para todos. Sinto como se estivéssemos condenados aquele dia da marmota em que todas as manhãs acordamos sem segurança, sem estradas, sem lei que regule os jogos de fortuna ou quota fixa, sem indicação de cambio confiável, sem orçamento aplicável de marketing ou mesmo sem saber mesmo quem somos como produto turístico e como nos comparamos com os que lideram o setor mundialmente. 

Falar do vizinho é fácil. Difícil é observar, estudar, aplicar estratégia e entrar na lista do top 10 mundial.

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Julio Gavinho é diretor na Lyon Capital Investimentos Imobiliários; professor do curso de MBA em Hotelaria de Luxo e do curso de MBA em arquitetura de luxo da Faculdade Roberto Miranda.