Ana Rita Cohen

Acredito que todos nós temos pelo menos um mentor (ou mentora); uma referência, que em um dado momento, faz um print na gente. 
No decorrer da vida, aparecem pessoas em nosso caminho que nos inspiram, nos impactam de alguma forma e muitas vezes marcam um momento de mudança. 

A situação geralmente acontece assim: alguém lhe recomenda um livro ou, uma matéria para ler e de repente, você se identifica com tal conteúdo. Logo, se interessa pelo autor, seus livros, perfil e assim por diante. Outra situação: você se inscreve para um curso, evento, ou uma palestra por curiosidade ao tema e pesquisa um pouco sobre o palestrante. Entra, senta-se no auditório, e no decorrer do evento se vê atraído, não somente pelo conteúdo apresentado, mas principalmente pela pessoa que, de forma especial mexe muito com você. Já lhe aconteceu algo assim? 

Estava com 30 e pouco anos, quando me deparei com uma experiência desse gênero. Vivia em Nova York e estava estudando gastronomia, quando percebi que queria aprender mais sobre nutrição. Foi quando conheci Anne Marie Colbin, fundadora da ‘Natural Gourmet Institute for Food & Health’, e uma das pioneiras do movimento da gastronomia saudável e medicinal. Anne Marie contribuiu muito formando chefes, desde os anos 70, com conhecimento técnico, clássico e holístico; com visão dos diversos sistemas dietéticos do planeta. Uma pessoa visionária, humanista e que deixou um legado precioso ao mundo. Tive a sorte de tê-la como mentora ainda num momento bastante ativo de sua carreira. 

Me lembro em uma de suas aulas, cujo o tema abordava as funções do cérebro em relação ao alimento. Em meio a gráficos, desenhos, gestos e palavras, comentou: “no lado esquerdo mora o intelecto, o racional, a ciência, os números, planilhas e pensamentos; se relaciona com o alimento no que diz respeito às calorias, nutrientes, peso, volume. No lado direito habita a intuição, a criatividade, a arte, o som, a forma, sensação e, se relaciona com a alimentação através do sabor, aparência, aroma, textura, cheiro, lembranças de família”. Citou exemplos brilhantes de como as ciências humanas e exatas naturalmente coexistem, dentro de cada um, numa constante busca pela harmonia…

Com esta abordagem, Anne Marie trouxe à luz 7 critérios, que segundo ela, caracterizavam uma alimentação equilibrada. Da mesma forma, passo a frente o que aprendi, pois cada vez mais entendo ser um tema bastante pertinente às demandas de nossa era. A ideia é sempre inspirar uma gastronomia mais consciente, sustentável e responsável. Assim seguimos: 

1. Que seja integral – íntegro conforme a sua origem mantendo todas as suas partes (comestíveis), sem desperdício; e se houver, algo está errado. Alguns exemplos são os grãos, cereais, leguminosas, vegetais, frutas, castanhas, sementes; pescados e aves pequenas. O preparo artesanal deve ser celebrado. Alimentos fragmentados e não integrais – como germes, farinha branca e açúcar branco, causam deficiências ao metabolismo, sendo este o primeiro fator que nos leva ao “craving” (desejo) por algo mais, justamente pela falta da totalidade dos nutrientes. 

2. Que seja fresco – e natural; sustentável e/ou orgânico quando possível. Por exemplo, vegetais congelados perdem seus nutrientes; adoçantes comerciais são substâncias que prejudicam as funções neurológicas; enlatados perdem a vitalidade natural do alimento, e para os que os consomem em grandes quantidades ao longo da vida, acabam dando espaço para o desequilíbrio das funções imunológicas no corpo. Outro exemplo é o leite de vaca, pois deveria vir de um único animal, ou pelo menos, de vacas da mesma família. Neste caso, a pasteurização do leite, combinado ao processo massificado desses animais, elimina a fonte natural de vitamina C, além de outros nutrientes. 

3. Sazonal – Os melhores alimentos para nós são os da estação. Por exemplo, talvez não seja tão legal consumir frutas importadas, oriundas do verão do hemisfério norte, enquanto vivenciamos o inverno no hemisfério sul. O corpo, de alguma forma sente que não está adequado. Estar em harmonia com as estações e região onde habitamos, é um passo importante para a prevenção e manutenção da saúde.

4. Local – e sazonal andam juntos. A produção que vem de sua região, além de ser mais sustentável, é melhor para a saúde.  

5. Em harmonia com a tradição familiar –  quando naturalmente nos alinhamos à nossa tradição familiar, nos sentimos em casa e em paz. 

6. Equilibrada –  implica no equilíbrio entre sabores e saberes, técnicas de cozimento, texturas, formas, cores. Também o equilíbrio entre os sistemas: ácido e alcalino, expansivo e contrativo, yin e yang; lembrando a presença dos 6 sabores: azedo, amargo, doce, pungente/picante, salgado, umami (O umami para quem não sabe, é reconhecido por nosso paladar quando comemos alimentos que possuem substâncias chamadas de aminoácidos, e promovem maior satisfação).

7. E que seja delicioso – é fundamental sentir prazer verdadeiro numa refeição. Comer por comer não é legal. Apreciar a pureza de cada sabor é um dom. O cérebro reconhece quanto sabor e paladar se alinham em busca do equilíbrio do corpo, apesar da industrialização dos alimentos nos provar um grande desafio. 

Nosso cérebro é ativado antes mesmo do primeiro contato do bebê com a amamentação materna. A partir da amamentação, é muito importante saber introduzir os primeiros alimentos aos nossos filhos. Cada alimento guarda em si uma história, propriedades nutricionais e energéticas; uma sabedoria que ecoa para a vida…

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Ana Rita Cohen começou sua vida profissional em Nova York, onde trabalhou, estudou, e iniciou sua família. Como primeira formação, participou de projetos do meio artístico em SP e NY. Trabalhou na The Asia Society (filiada à Rockfeller Foundation, NY) onde se apaixonou pela arte e beleza do alimento; pela sábia gastronomia da cultura asiática. Decidiu investigar a gastronomia, entrando para a A Peter Kump’s Cooking School – hoje Institute of Culinary Arts -, seguida pela The Natural Gourmet Institute for Food & Health, cuja filosofia e conceito de saúde contribui bastante em seu caminho. Dalí veio a formação em Medicina Chinesa. Mais tarde, de volta ao Brasil, criou a Bread, Food & Goodtime em Florianópolis, com cursos livres. Ao mesmo tempo entrou para mentoria e assessoria em restaurantes. Em 2012 cursou Nutrição a base de plantas no Nutrition Studies Center, com o Dr. Thomas Campbell. Em 2014 participou do curso The Age of Sustainable Development com Jeffrey Sachs, na universidade de Columbia, NY, e saúde pública com a John Hopkins B.School of Public Health, entre outros.

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(*) Créditos das fotos e imagens: divulgação/Ana Rita Cohen