(imagem: logisticadescomplicada.com)
 
Alguns jargões permanecem tão arraigados à cultura brasileira que até valem ser reconstruídos. É sabido que “uma andorinha só não faz verão”, todavia, com ao menos três delas, consegue-se chegar, quem sabe, a uma primavera e um dia de sol tímido com 20º graus de temperatura. O exemplo da ave passeriforme hirundinídea recente na hotelaria leva três nomes: o da mineira Vert Hotéis e os das fluminenses Windsor e Othon.
 
As três citadas anunciaram e já estão dando andamento a projetos de capacitação para seus colaboradores com escolas próprias. A Windsor, vale mencionar, forma sua primeira turma em dezembro próximo, somando 400 inscritos para um espaço de 120 vagas. Garçom, camareiro(a)/arrumador(a), barman/barwoman, capitão-porteiro e mensageiro transpõem, com a formação, seus conhecimentos do campo metafísico para o empírico.
 
Necessário comentar o papel social que tais medidas carregam. A da Vert Hotéis tem um insígnia sustentável e será construída, até 2013, com responsabilidade de reverter parte da renda obtida a ONGs que atuam na despoluição de rios. A Academia Othon nasce com a proposta de formar não somente para atuar no mercado hoteleiro, mas também funcionários que não tiveram oportunidade de cursar os 1º e 2º graus. O projeto da Windsor conta com a participação logística do CCCM (Centro de Cidadania Cidade Maravilhosa) – ONG especializada em projetos de qualificação de mão de obra em comunidades carentes, no intuito de viabilizar a formação profissional nestes locais.
 
Não sejamos poliânicos: o discurso quase uníssono dos representantes destas redes é que o setor vai precisar de mão de obra qualificada para aproveitar com maestria o boom que a hotelaria vivencia. Pode haver sim ideologia e interesse de aprimorar o mercado, mas é tangível que as medidas se embasam, antes de mais nada, em cifrões.
 
Ainda assim, é preciso se render à evidência clara de que o setor está se articulando para tirar o retrospecto de que a formação dos profissionais tende a naufragar se continuar presa à academia. É um estigma que perdura há anos não somente na hotelaria, mas na educação brasileira como um todo: a universidade vive de um distanciamento intelectual muito discrepante da realidade encontrada em inúmeros mercados de trabalho.
 
E aí as escolas criadas pelas próprias empresas tendem a fazer a ponte entre o conhecimento a priori e o conhecimento a posteriori. A academia é o desenho de mundo ideal, no qual tudo são flores e a teoria pode respaldar qualquer tipo de argumento.
 
Contudo, por má sorte, não há instituição que supra o aprendizado transmitido por pessoas que estão, de fato, no dia a dia de uma operação hoteleira – o que pode vir a se consolidar com as escolas das próprias redes. Essa troca, vale dizer, tende a tomar muito mais dimensão para que se aprenda cunhado na realidade do que se faz hoje – e não na série de métodos ocos que, em alguns casos, representam modelo senil de uma hotelaria esquecida, talvez, no museu do setor nos idos de 1980. As nuances do mercado se acirram copiosamente e cotidianamente. O profissional tem, por conseguinte, de estar apto ao jogo dialético da mudança.
 
Tendo demorado mais do que seria razoável para ocorrer, sem deixar de mencionar outras redes que já o fazem há tempos e são referência neste tipo de formação, a exemplo da própria Academia Accor, tais medidas devem ser aplaudidas por serem, especula-se, o desmanche do enfeudamento e da apatia que por muitos anos fez-se do tema capacitação. Não à toa a mídia reproduz desenfreadamente, não só falando do setor hoteleiro, material que mostra carência de profissionais em determinados cargos.
 
É preciso entender que, em se tratando de formação, não há presunção de espera, uma vez que o tema perdura há tempo sem pujança e com um ranço que está muito mais para presunção de serôdio e abjeto. É hora de fazer e, sem recato, reproduzir tal molde.